13 de junho de 2011

A BATALHA DO APOCALIPSE



Passei os últimos dois meses devorando A Batalha do Apocalipse, do estreante Eduardo Spohr, que por sinal começou muito bem.

Misturando ingredientes controversos como história, política, filosofia, religião e uma pitada de romance, o novo Chef conseguiu elaborar um prato encorpado, intenso, merecedor de uma degustação demorada, necessária para a apreciação de suas várias tramas, envoltas em misticismo, magia e batalhas.

“Mas, com o tempo, ele foi entendendo que os eventos espirituais encontram reflexo no plano físico. Foi assim que, pela primeira vez, percebeu os sinais, os indícios que confirmavam os últimos dias da terra. Começou com aquilo que os profetas chamaram de ‘Cavaleiros do Apocalipse’. Não houve cavaleiro de fato, nem entidades montadas que personificassem a previsão. Mas o renegado podia percebê-los nas guerras (...), na fome (...), nas epidemias, (...) e em todo lugar onde a morte arrastava seu manto. Depois a situação mundial se degradou, e isso nada teve a ver com as forças infernais ou celestiais.” – Pág. 41

À mesa fantástica de Spohr encontram-se diferentes castas de anjos, demônios, magos e outras criaturas incríveis, entre eles os humanos, e sua especial essência. Ocupando lugares de honra, o renegado Ablon, a feiticeira Shamira, o Arcanjo Miguel, o misterioso Anjo Negro e o próprio Lúcifer, todos ansiosos pelo despertar do Criador, evento que determinará o dia do Juízo Final, a batalha que decidirá o destino da humanidade.

“Mas isso tudo seria simplesmente mais uma guerra, não fossem os rasgos permanentes no tecido da realidade. Todos, anjos e demônios, sentiram que a membrana estava se desfazendo.” – Pág. 43

Mas até que finde o sétimo dia, e Yahweh acorde do sono que dura desde a criação do universo, acompanhamos Ablon e os demais em suas viagens pelo mundo, dos dias imemoráveis aos atuais, transitando entre o céu e o inferno, descobrindo dimensões singulares que parecem ter envolvido alquimia em seu preparo que, quase em banho-maria, os incorporou de maneira deliciosamente precisa, resultando em uma ficção de dar água na boca.

Com uma linguagem formal e uma narrativa não-linear, o texto é entrecortado por flashbacks que contextualizam, ilustram e esclarecem, auxiliando-nos na digestão de acontecimentos quiméricos, servidos em porções generosas. Outros ingredientes que contribuem para a leitura são o glossário e a linha do tempo, servidos ao final da obra, embora fossem mais interessantes se acompanhados de um mapa.

No prefácio vemos uma comparação entre A Batalha do Apocalipse e a obra de Tolkien, que mostrou-se justa, uma vez que o livro tem o poder de nos transportar para outro mundo, outro tempo, sentenciando-nos à angústia do retorno quando a leitura precisa ser interrompida. Pessoalmente, comparo-a ainda ao Código da Vinci e Anjos e Demônios, de Dan Brown, que juntam homogeneamente ingredientes reais e imaginários, fazendo-nos acreditar no impossível.

Diferentemente da comparação literária, a gastronômica é única, não havendo melhor opção que um Filet de Boeuf Béarnaise: combinação desafiadora, ingredientes cuidadosamente reunidos, habilidade no preparo. Delicioso!

Como acompanhamentos, um bom tinto, fresco e frutado, e Lullaby, com Loreena Mckennitt.

Ah, e não se assuste se ao término da leitura você perceber as oscilações de energia como "rasgos no tecido da realidade"...